quarta-feira, 23 de maio de 2007

Uma Revista de Imprensa para ser ouvida

Na Antena 1 (2ª a 6ª feira às 8h20) João Paulo Guerra edita, de forma irrepreensível, o modelo clássico de uma revista de imprensa na rádio: um texto encadeado com alusões às mais relevantes notícias dos diversos jornais, contextualizando referências, relacionando factos e fazendo ressaltar evidências menos óbvias, naquilo que pode ser considerado como um virtuoso exercício de escrita. Ademais, servido por uma postura altamente credível de enunciação, fruto da vasta experiência radiofónica do jornalista. É este modelo de revista de imprensa, que vem dos anos 60 e 70 do século passado, que se confronta agora com uma outra forma de divulgar aquilo que de mais importante e interessante têm para oferecer, aos potenciais leitores, os jornais e revistas.
No RCP (2ª a 6ª feira, entre as 7h e as 10h, com várias intervenções) Nuno Domingues, a sós às 7h55, e com a cumplicidade de João Adelino Faria depois das 8h, olham para a imprensa comentando a importância de uma notícia, avaliando a estética de uma mancha gráfica, sublinhando uma curiosidade neste ou naquele periódico, sem deixar de ter uma perspectiva transversal sobre temas comuns a diversos jornais ou revistas. Esta fórmula ressente-se, por vezes, da oralidade de uma improvisação que não é suficientemente preparada, mas não deixa de ser atractiva para quem quer conhecer tópicos do "mundo impresso" que lhe permitam fazer uma opção antes da compra deste ou daquele periódico e que, simultaneamente, não tem tempo nem disponibilidade para digerir, à hora do pequeno almoço, um exercício formal de escrita, por mais bem conseguido que ele seja, como é o caso da revista de imprensa assinada por João Paulo Guerra. Neste caso é o próprio modelo que evidencia uma das limitações que se põem a um texto escrito para a rádio emitida pela via hertziana: uma catadupa de ideias e um aprimoramento no estilo nem sempre se traduzem numa apreensão fácil e consequente por parte do ouvinte, que não tem hipótese de voltar atrás para apanhar um sentido que lhe escapou ou para reprocessar um raciocínio que não entendeu. No frenesim do actual dia-a-dia, a rádio não pode ter a pretensão de requerer o máximo de atenção dos ouvintes. No caso das revistas de imprensa, cumprirá, razoavelmente, a sua missão se, ao menos, conseguir chamar a atenção de quem ouve para aquilo que considera mais relevante nas publicações impressas.

3 comentários:

Anónimo disse...

Análise útil e esclarecedora...embora haja público para um e outro modelo, esta análise tem o mérito de nos tornar atentos às diferenças e críticos nas escolhas.

Nuno Domingues disse...

Salut!!

Tenho pena de não ouvir o trabalho do João Paulo Guerra, mas devo dizer que nesta altura, a melhor revista de imprensa que oiço, está disponível na Internet, em Podcast.
Chama-se "assim vai o mundo", e é assinada todos os dias por Francisco Sena Santos. Porque a mais útil das revistas de imprensa é aquela que mostra os jornais que mais dificilmente estão visíveis nas bancas.
Nesse sentido, o espaço da revista de imprensa internacional, está por preencher nas manhãs da rádio.

Bye!!

Vítor Soares disse...

Francisco Sena Santos domina como poucos a capacidade de escrever um texto para ser ouvido impregnando-lhe uma forma de oralidade que - como nos ensina Eduardo Meditsch - é apenas uma das meias-verdades da linguagem da rádio. Tal qual a naturalidade, que é tão mais eficiente quanto mais planeada e calculada minuciosamente, ou seja, quanto mais for artificial. A ilusão brilhantemente criada com a escrita de FSS esbarra, contudo, na enunciação do texto. Neste ponto, Sena Santos nunca conseguiu ultrapassar os limites do seu próprio aparelho fonador acabando por travestir as hesitações e o pára-arranca do discurso como uma forma de naturalidade. Todavia, e citando novamente Meditsch, "o jornalista de rádio não tem que agir com naturalidade, mas sim com eficiência no domínio da sua linguagem falada".
Quanto ao conteúdo de "Assim vai o mundo" não custa reconhecer que se trata de um autêntico banho de cosmopolitismo, um bálsamo que nos reconcilia com a actualidade dos 4 cantos do mundo.