quinta-feira, 7 de junho de 2007

A lógica do consumo "pós-moralista"

No passado fim-de-semana, o filósofo francês Gilles Lipovetsky veio a Lisboa dizer que "é preciso corrigirmos o lugar que o consumo ocupa nas nossas vidas, fazendo-o em nome de uma ética das pessoas e não da felicidade". Embora admitindo que as satisfações materiais são ingredientes de uma vida feliz, Lipovetsky sublinhou que "o crucial é que as satisfações aconteçam fora dos paraísos passageiros do consumo". Todavia, manifestou-se "contra a postura hipócrita de alguns intelectuais que consideram que a evasão efémera é uma necessidade inferior". Longe estão as visões fundamentalmente escapistas e redutoras do consumo, segundo as quais as pessoas trabalhavam para consumir e, em seguida, consumiam-se a trabalhar, fechando um ciclo sem saída possível. Ao pugnar por "uma ecologia mais equilibrada da existência" corrigindo o lugar que o consumo ocupa em nome de uma ética das pessoas, Lipovetsky tende a associá-lo à cidadania, de modo a que o valor atribuído ao consumo possa ter uma expressão equiparável aos valores cívicos. Porque a cidadania mudou (já não é só sócio-política, é também económica e cultural) e o consumo também mudou (já não é só económico, é também sócio-político e cultural). Para um cidadão e consumidor particularmente atento à situação nos media é exemplar o quadro referencial elaborado por Michael Schudson no ensaio "Citizens, Consumers, and the Good Society". Advogando uma posição "pós-moralista" na análise da cultura de consumo, Schudson sustenta que é um erro identificar a acção política com motivações altruístas de dedicação à causa pública e, em oposição, identificar os comportamentos consumistas apenas com motivações de interesse próprio. Ambos os comportamentos - sustenta Michael Schudson - podem ser uma e outra coisa. Desde a década de 70 do século passado, com Jean Baudrillard e Guy Debord, sabemos que o consumo é uma ameaça para o equilíbrio do ser humano e a espectacularização um risco para a sociedade. Aos consumidores dos meios de comunicação social resta tentar fazer a apropriação do consumo e do espectáculo, veiculados pelos media, de molde a transformar ambos num leque de oportunidades para a cidadania.

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